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Chego eu como de praxe, adentro pelo portão, saúdo a casa do “Grande
Mensageiro e Guardião” que ficava do lado do portão, fui até ao lado do salão
do Orixá de onde vejo ao fundo do quintal a parede do quarto dos ancestrais Ilê
abó aku (mas popularmente chamado de Balé no Nagô Egbá) e a maravilhosa
Gameleira e a Jaqueira que existia por trás do salão do Orixá, (local onde tive
a honra de assistir vários atos litúrgicos com a presença de meu pai e alguns
amigos, Srº Humberto Toriabê, João Galdino filho de Tia Mãezinha Iyámidê, Srº
Zezinho Obálajô e dentre outras figuras do Candomblé (nesses rituais só tinha
presença masculina), depois fui até o salão do Orixá e depois voltei ao quintal
e fui até aos pés da árvore sagrada da Juremeira que ficava em frente ao
terraço da casa de meu pai e de lado da escadaria que ao subir se chegava ao
salão da Jurema. Pois no quintal do meu pai eram dois salões e a casa dele.
Pedi bênção a minha Mãe Eunice e a meu Pai Grivaldo que como sempre me
dava logo um esporro.
Ele dizia: É né chegou agora!
Deus te faça feliz.
Cadê dona Bazú?
Cadê Socorro e Valter?
Tem visto Araguacý?
Eu de pronto respondia, (com voz baixa regada a muito respeito, assim
era naquela época, muito diferente do tratamento de hoje em alguns terreiros
onde a educação litúrgica é execrável).
Ficamos ali conversando eu e ele, aquela figura imponente com aquele
cachimbo na boca sentado num banco. Essa figura que carrego no coração para
eternidade, só comparável ao meu Pai José Iguaracy Felipe da Costa que se
tornou meu Pai após a perda física de Pai Grivaldo.
De repente em plena “Sexta-feira da Paixão” entra no quintal uma moça
aos gritos... Srº Brivaldo me socorra!!!
Com uma criança nos braços desmaiada, meu Pai de pronto atendeu
perguntando o que ocorreu, a moça relatou que a criança estava há dois dias com
febre já tinha levado ao posto médico e quando volta para casa à febre retorna
de tal forma que a criança desmaiava. Meu pai tomou aquela criança nos braços e
ele entrou no quarto da Jurema, eu o auxiliei segurando a criança enquanto Mãe
Nice acalmava a genitora desesperada. Alguém diz lá fora, meu Deus hoje é
“Sexta-feira Santa” não é dia de mexer com espíritos.
Depois de uma bela fumaçada no ar e um toque numa taça com um cipó de
Jurema, meu velho estremeceu e acostou meu Padrinho Srº José da Pinga e aos
berros disse “Louvado Seja Deus!!! Quem pode mas de que Deus?”
Pegou umas folhas de japecanga amaçou com cachaça e esfregou com força
nos pés da menina e a criança foi tornando.
Daí meu padrinho diz: “Leva essa criança ao homem do anel, que Deus e o
encanto mestre vão ajudar isso é doença material não espiritual”.

Depois de tudo resolvido eu perguntei... Pai como pode hoje “Sexta-feira
Santa” o Mestre veio?
Ele no alto de seu saber e ciência me respondeu: “Oxente e o Mestre iria
deixar a criança morrer”? Nessa mesma hora tem gente matando outras pessoas,
gente nas casas de recursos (comumente era chamado às casas de prostituição e
motéis da época), tudo bebendo e muitos fazendo mal aos outros. A cristandade é
uma coisa o cristianismo é outra e a Jurema é o caminho seguro.
Que bela história dos antigos terreiros nagô e Jurema. Convivi com pessoas assim nos idos dos anos 70 em Maceió. Terreiros simples, gente humilde, mas com muito axé e ciência. Lindas mesas de Jurema às quintas-feiras,Estados de caboclo com muitos princípes e muitas flores, plantas, sementes, e a fumaça cheirosa tomando o ambiente saída das gaitas dos mestres e caboclos. E toadas lindas e de recados fortes: "Malunguinho está na mata, fazendo cerca de espinho, abre, abre Malunguinho, abre todos esses caminhos". Ah... Saudades! Parabéns ao Padrinho Sandro que luta por preservar esses encantos de nossa ancestralidade! Saravá os mestres. Salve a fumaça. Salve o Angico. Salve o Vajucá!!
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